As condutas tipificadas como crime ambiental podem ser consideradas insignificantes? O Superior Tribunal de Justiça - STJ entende que sim.
O MEIO AMBIENTE E DIREITO FUNDAMENTAL
A controvérsia decorre no fato de o meio ambiente ser entendido como direito fundamental, previsto no artigo 225 da Constituição da República como “essencial à sadia qualidade de vida” e por isso tutelado nas esferas civil, administrativa e penal.
Por sua importância como corolário do direito à vida, a proteção do meio ambiente na esfera penal é de todo conveniente, visto que o direito penal tem como função, justamente garantir a incolumidade aos bens mais importantes da sociedade.
Assim, parece contraditório reconhecer como insignificantes bens de abrangidos pelo direito ambiental.
Em que pese a correção desse entendimento, é possível que algumas condutas que violam o direito ambiental, possam e devam ser consideradas insignificantes.
O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
O Princípio da Insignificância emana do brocardo romano: "minimis non curat praetor” e significa que o direito penal deve desprezar os casos insignificantes para cuidar das questões realmente inadiáveis.
Conforme entendimento do STF, é medida de política-criminal, pois funciona como vetor interpretativo restritivo do tipo penal, objetivando a exclusão da incidência do Direito Penal perante as situações que resultem em ínfima lesão ao bem jurídico tutelado.
Logo, se a finalidade precípua do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos mais sublimes e relevantes para a sociedade, há determinados bens que não demandam a tutela do Direito Penal, tendo em vista a irrelevância da conduta que os lesionou ou expôs a lesão, casos em que não haverá justificativa para incidência da tutela penal. Para eles o Direito Penal deve ausentar-se e possibilitar que os demais ramos do Direito assumam a sua proteção.
Conforme Maurício Ribeiro Lopes, as severas dificuldades econômicas ocorridas no continente europeu, provenientes da Segunda Guerra Mundial, resultaram no aumento da criminalidade de bagatela, o que fez com que o Princípio da Insignificância nascesse vinculado, a priori, aos crimes de natureza patrimonial (LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Princípio da insignificância no Direito Penal. 2° edição, São Paulo: RT, 2000).
Apesar de sua origem, com o passar do tempo teve o reconhecimento de seu campo de incidência ampliado consideravelmente, devendo hoje ser analisado, sobretudo, diante das circunstâncias do caso concreto, expandindo sua aplicação inclusive para os delitos ambientais.
Como podemos perceber abaixo, a jurisprudência do STJ, contempla a insignificância em vários de seus julgados, em especial, citamos dois recentes acórdãos decididos naquele Tribunal, ambos julgados em agosto de 2014.
O STJ E O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
O STJ E O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
O primeiro, trata-se de um agravo regimental em recurso especial, cujo objeto em discussão foi o desmatamento em Unidade de Conservação (art. 40 da lei n. 9.605/1998). O STJ aplicou o princípio da insignificância, reconhecendo a condição do réu (pequeno produtor rural que utilizou a área desmatada para fins de sustento de sua família).
No acórdão, o Ministro Relator esclareceu que o STJ firmou orientação no sentido de ser possível a aplicação do princípio da insignificância em sede ambiental, exigindo, para tanto, a conjugação dos seguintes vetores: mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.
O Tribunal Regional, ao analisar o conjunto fático-probatório dos autos, entendeu que a lesão ao bem jurídico tutelado se revelou praticamente inexpressiva, ressaltando, ainda, que a área desmatada está se recuperando naturalmente e diante disso, concluiu que a intervenção do Poder Público por meio do direito Penal é desnecessária, considerando que não restou demonstrada a degradação ou risco de degradação de toda a flora que compõe o ecossistema local - Parque Nacional da Serra do Divisor -objeto de especial preservação. (AgRg no REsp 1366185/MG AgRg em REsp 2013/0041043-8).
No segundo julgamento, o fato considerado insignificante foi o de pesca em período proibido (art. 34 da lei n. 9.605/1998), onde o STJ considerou atípica a conduta, por ausência de efetiva lesão ao bem protegido pela norma.
O Ministro relator aplicou precedentes daquela Corte Superior, que tem admitido a aplicação do princípio da insignificância, quando demonstrada, a partir do exame do caso concreto, a ínfima lesividade ao bem ambiental tutelado pela norma.
Segundo o relator, “Muito embora a tutela penal ambiental objetive proteger bem jurídico de indiscutível valor social, sabido que toda intervenção estatal deverá ocorrer com estrita observância dos postulados fundamentais do Direito Penal, notadamente dos princípios da fragmentariedade e da intervenção mínima“.
E ainda: “A aplicação do princípio da insignificância (ou a admissão da ocorrência de um crime de bagatela) reflete o entendimento de que o Direito Penal deve intervir somente nos casos em que a conduta ocasionar lesão jurídica de certa gravidade, permitindo a afirmação da atipicidade material nos casos de perturbações jurídicas mínimas ou leves, consideradas também em razão do grau de afetação da ordem social que ocasionem”.
A fundamentação prossegue, esclarecendo que: “Na espécie, ainda que a conduta do apenado atenda tanto à tipicidade formal (pois constatada a subsunção do fato à norma incriminadora) quanto à subjetiva, haja vista que comprovado o dolo do agente, não há como reconhecer presente a tipicidade material, na medida em que o comportamento atribuído não se mostrou suficiente para desestabilizar o ecossistema”.
(AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.263.800 - SC 2011/0154972-9).
(AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.263.800 - SC 2011/0154972-9).
Ambas as votações se deram por unanimidade.
Grande abraço,
JOSÉ ROBERTO SANCHES
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