O que é um mosquito, afinal?
Talvez ele possa ser definido como um pequeníssimo inseto alado, que muitas vezes nos causa um dano imenso.
Assim é o aedes aegipty, vetor da dengue, da febre amarela e da febre chikungunya e também o Lutzomyialongipalpis, vulgo mosquito-palha, vetor da temida leishmaniose visceral.
Aqui em Araçatuba, interior de SP, milhares de cães já foram eutanasiados por serem portadores de leishmaniose e também porque a Portaria Interministerial 1426/2008 proíbe o seu tratamento.
Mas tem sentido matar as vítimas?
Ou ainda: a morte dos cães resolverá o problema da proliferação da doença?
Assim também tem entendido o Poder Judiciário, o qual em mais uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3),
impediu a utilização da eutanásia como meio de controle da leishmaniose visceral
em cães.
Trata-se da determinação da 6ª Turma do TRF- 3, que deu provimento a agravo de instrumento
interposto pela organização não governamental (ONG) Sociedade de Proteção e Bem
Estar Animal - Abrigo dos Bichos, de Campo Grande/MS, proibindo tal prática nos
cães do munícipio.
O acórdão foi baseado em jurisprudência do TRF3 e de tribunais superiores, que entende desprovida de razoabilidade e proporcionalidade a eutanásia como medida de controle da leishmaniose visceral.
Conforme a decisão, a medida vai contra dispositivos constitucionais relativos ao direito de propriedade, vedação à violação do domicílio, além de constituir-se crueldade contra animais, provocando desconforto e a ira da comunidade.
Para os magistrados, ao invés de utilizar da prática da extinção dos animais, o poder público deveria adotar providências para erradicar os focos (criadouros) do vetor (Lutzomyialongipalpis) do protozoário que infecta humanos e animais e também promover pesquisas com medicamento já usado em outros países para a cura das vítimas da doença.
“Infelizmente, dos 88 países do mundo onde a doença é endêmica, o Brasil é o único que utiliza a morte dos cães como instrumento de saúde pública; ou seja, o Brasil ainda viceja numa espécie de "Idade Média" retardatária, onde a preocupação é eliminar ou afastar a vítima e não o causador da doença ("mosquito-palha", nome científico Lutzomyialongipalpis) que espalha o protozoário Leishmania chagasi”, salientou o desembargador federal Johonsom di Salvo, relator do processo no TRF3.
Para o desembargador federal relator, a prática adotada para controlar a doença pelo poder público no município de Campo Grande ofende de modo brutal o artigo 225, parágrafo 1º, inciso VII, da Constituição Federal.
“Não tem o menor sentido humanitário a má conduta do município em submeter a holocausto os cães acometidos de leishmaniose visceral (doença infecciosa não contagiosa), sem qualquer preocupação com a tentativa de tratar dos animais doentes e menos preocupação ainda com os laços afetivos que existem entre humanos e cães, pretendendo violar o domicílio dos cidadãos sem ordem judicial para, despoticamente, apreender os animais para matá-los”.
“A ação do Poder Público - incompetente para evitar a proliferação do lixo onde viceja o mosquito vetor da doença - não impede que o proprietário ou um terceiro tratem do animal, o que pode ser feito com medicação relativamente barata (Alopurinol, Cetoconazol, Levamizol, Vitamina A, Zinco, Aspartato de L-arginina e Prednisona), sem que se precise recorrer a uma medicação específica para os animais (Glucantime) que no Brasil é proibida, enquanto no mundo civilizado (Espanha, França, Itália e Alemanha) está à venda para o tratamento dos animais”, argumentou.
A polêmica do tratamento de cães com leishmaniose visceral já foi levada ao Supremo Tribunal Federal - STF, onde foi questionada a Portaria Interministerial 1426/2008, que proíbe o tratamento de cães infectados.
A Portara havia considerada ilegal pelo TRF-3 e por meio de recurso, chegou no STF.
Em decisão monocrática, de outubro de 2013, o Ministro Joaquim Barbosa, à época presidente do STF, manteve a decisão do TRF-3.
Apesar disso, a Advocacia-Geral da União publicou parecer informando que a liminar concedida não afastou a obrigatoriedade de cumprimento das normas técnicas veiculadas pela Portaria, uma vez que ela não foi ainda declarada inconstitucional pelo STF.
Conclusão: Na maior parte do Brasil ainda persiste a dúvida quanto à legalidade do tratamento de cães infectados com Leishmania chagasi, à exceção Campo Grande, onde a eutanásia canina (ao menos por enquanto), está mais uma vez proibida.
Agravo de instrumento
0013792-50.2010.4.03.0000/MS
Grande abraço,
JOSÉ ROBERTO SANCHES
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